O mundo está chocado com o
ataque terrorista ao escritório da revista semanal satírica Charlie Hebdo. Ao menos doze
vidas foram ceifadas de maneira cruel e covarde. Pior, os bandidos assim agiram
julgando prestar um serviço a Deus! Por outro lado, porém, tem-se tratado do
incidente como um atentado à liberdade de imprensa. Mas será que essa atitude
criminosa, além de uma inequívoca violação do direito à vida, é também uma
ofensa ao direito de manifestação de atividade artística ou de comunicação?
É inegável que a liberdade
de imprensa tem limites. Não seria lícito, por exemplo, que um jornal se
dedicasse a incitar os seus leitores ao terrorismo. Portanto, é necessário
estabelecer mecanismos eficazes para evitar abusos no exercício do direito e do
dever de informar.
No entanto, não é fácil
estabelecer a linha divisória entre o que é livre expressão de atividade
intelectual, artística, científica e de comunicação, por um lado, e, de outro,
o que é abuso desse direito, por violar outros atributos igualmente importantes
da pessoa humana, tais como a honra, a dignidade e a imagem.
A imprensa tem o dever de
relatar os fatos que são relevantes no seu ramo de atuação. Tem também o
direito de manifestar a sua opinião sobre os acontecimentos que relata e sobre
quaisquer outros temas que se disponha a abordar. E os seus âmbitos de atuação
são variadíssimos. Dentre esses, convém mencionar – porque especificamente
relacionada com o tema – a atividade humorística. E a essa também se aplica os
mesmos princípios de liberdade de expressão, com respeito aos direitos
individuais e coletivos.
E o limite do direito e do
dever de informar está precisamente na dignidade da pessoa humana enquanto tal,
bem como na sua condição de integrante de um grupo social, povo, nação etc.
Mais ainda, pode-se dizer que cada ser humano é o que é, ou seja, com os seus
atributos corporais, mais, e sobretudo, aquilo que ama e acredita. Nesse
sentido, as convicções religiosas, filosóficas, políticas etc. marcam também o
modo de ser de cada pessoa. Por isso, ridicularizar tais convicções é afrontar
a dignidade da pessoa naquilo que ela tem de mais íntimo e importante.
Assim, as charges
ridicularizando Maomé, por exemplo, afrontam fortemente os sentimentos de todo
um povo e, por consequência, de cada um dos indivíduos que o compõem.
Igualmente, quando o Papa é reproduzido em imagens de enorme mau gosto,
sugerindo atitudes manifestamente contrárias à fé católica, de certo modo, todo
católico é vilipendiado no seu irrenunciável e inviolável direito à dignidade.
E quando o assim agem, os profissionais do Charlie Hebdo cometem inequívoco
abuso de direito.
Um critério bastante seguro
para exercer o direito de informar sem violar a dignidade alheia é o exercício
de se colocar no lugar do outro. Por exemplo, ainda que um chargista seja ateu,
agnóstico etc., por certo há pessoas que ele ama e respeita. Pois bem, antes de
ridicularizar Maomé, o Papa ou Jesus Cristo, poderia fazer o exercício de
imaginar como se sentiria se aquelas pessoas a quem ama e estima fossem
desrespeitadas da mesma maneira. Convém ressaltar que é perfeitamente possível
produzir obras humorísticas de qualidade sem ofender a ninguém.
É de se lamentar e repudiar
profundamente o ataque ignóbil e covarde que vitimou aquelas pessoas em Paris.
É hora de o mundo se unir fortemente contra o terrorismo. No entanto, as
vítimas desse crime hediondo não são mártires da liberdade de imprensa. São,
isso sim, vidas aniquiladas injustamente, cujo sangue brada ao Céu por justiça.
E, com o devido respeito, não há divindade tão mesquinha a ponto de aprovar tal
barbárie.
Dr.Fábio H.P. de Toledo – Juiz
de Direito - Universitat Internacional de Catalunha UIC.
Espanha.
Por Diácono Rilvan Stutz –
Escritor Apecom
Igreja Presbiteriana do
Brasil
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