Periodicamente as igrejas evangélicas precisam promover a eleição e consagração de oficiais eclesiásticos, sejam presbíteros ou diáconos. Cada comunidade adota determinados critérios, levando em conta a maturidade espiritual, o dom específico aparente, a disponibilidade em servir e etc. Infelizmente, também há relatos de um processo mais político do que bíblico em tais escolhas e também há os casos em que os oficiais foram eleitos por antiguidade ou popularidade entre os irmãos. Curiosamente não são justificados critérios heterodoxos na escolha de oficiais, pois este é um tema que as Escrituras Sagradas tratam com extrema clareza em determinados textos do Novo Testamento (Atos 6.3; 1 Timóteo 1-13; 5.17; Tt 1.5-11).
No primeiro deles em destaque entre os parênteses, lemos sobre a eleição dos primeiros diáconos na história do cristianismo e para o mesmo foram empregados critérios pelos apóstolos a fim de que a igreja de Jerusalém (Igreja Primitiva) fizesse uma escolha satisfatória. “Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste serviço” (Atos 6.3).
Atos capítulo 6 relata um momento interessante na história da igreja primitiva. Muitos dos judeus helênicos que se converteram na pregação de Pedro (Atos 2.14-41) se recusaram a voltar para seus países de origem (Atos 2.9-11), criando uma situação social crítica para a igreja que precisou resolver as demandas materiais do grupo (Atos 2.45). Entre as necessidades mais básicas estavam as cestas de provisões que eram distribuídas diariamente para as viúvas. Acontece que entre as mesmas havia as naturais de Israel e aquelas que também eram judias, mas nascidas ou habitantes de outras nações. Uma má distribuição estava acontecendo, gerando críticas por parte do grupo prejudicado (viúvas helênicas). Para promover a equidade no tratamento para com aquelas mulheres, os apóstolos decidem pela indicação de sete irmãos que pudessem distribuir as provisões de forma que todos ficassem satisfeitos. É nesse momento que lemos a orientação apostólica: “Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste serviço”. É verdade que ainda é discutido se tais homens equivalem aos nossos atuais diáconos. Há intérpretes que não vêem nenhuma relação daqueles com os oficiais de hoje. Outros, entretanto, enxergam no texto o embrião do oficialato da igreja. Partindo deste segundo pressuposto, vejamos quais os critérios indicados na orientação dos apóstolos para aqueles que desejam servir a Deus como diáconos.
1 – “Escolhei dentre vós” (Critério Eclesial)
– O diácono deve sair da própria comunidade da fé. Ele não deve ser um agente externo na sua igreja. A igreja deve gerá-lo, formá-lo, produzi-lo. O saudoso Rev. Manoel da Silveira Porto Filho (pastor e teólogo congregacional) costumava dizer que a “Igreja é minha mãe; dela me alimento; dela me educo”. A comunidade da fé deve ser um ambiente saudável para a formação de seus oficiais. Tanto diáconos, como presbíteros e também pastores. Igrejas saudáveis produzem obreiros saudáveis. Igrejas maduras produzem obreiros maduros. Os apóstolos não titubearam em sugerir a escolha entre aqueles irmãos da primeira comunidade cristã, pois, a despeito de sua incipiência, a igreja primitiva demonstrava saúde e maturidade, apesar de suas imperfeições (a própria crise geradora da necessidade da escolha dos diáconos revela isso).
Os apóstolos não se sobrecarregaram com a tarefa da distribuição de alimentos. Não julgaram que somente eles poderiam resolver aquele problema. Não tentaram algum monopólio sobre a igreja, mas, ao contrário disso, convocaram os crentes para o serviço e entenderam que os tais também eram dotados e capazes de servir com qualidade a igreja de Jesus Cristo. Além disso, é digno de nota a democracia praticada na questão, pois os apóstolos, mesmo gozando de grande estima pelos irmãos, não tentaram escolher os que serviriam às mesas.
Ao contrário, deixou que os próprios da comunidade os escolhessem. Os apóstolos estabeleceram os critérios, mas a escolha coube a igreja (congregacionalismo). Outro aspecto importante, é que os sete diáconos levantados (Estevão, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Pármenas e Nicolau) foram reconhecidos como dotados das capacitações para o ministério. Isto é importante de ressaltarmos, porquanto é evidente que no seio da igreja ninguém precisa lutar por reconhecimento, pois este é patente aos olhos dos santos. Quando alguém é chamado pelo Senhor, a igreja, naturalmente, reconhece. Os irmãos o escolhem “dentre eles”.
2 - “Boa reputação” (Critério Ético)
– O segundo critério para escolha dos diáconos, apontado pelos apóstolos, foi ético. Os homens levantados para servir na comunidade da fé deveriam ser de boa reputação; de boa conduta; de bom testemunho; aceitos pela comunidade; vistos como sérios; como homens em que nada se podia acusar; respeitáveis; modelos; padrões; dignos de confiança. Como sabemos, no contexto de Atos 6, os diáconos estavam sendo levantados para distribuir os recursos materiais entre as viúvas pobres, logo, eles teriam que lidar com dinheiro e outros recursos e, sendo assim, precisavam, então, ter a confiança dos apóstolos e também do povo da grei. Portanto, houve, é claro, critérios subjetivos, como a unção do Espírito Santo, mas também foram observadas a vida prática e cotidiana dos candidatos à diaconia. A liderança eclesiástica deve ser ocupada por homens e mulheres que reflitam a face de Cristo e honrem o bom nome do Senhor Jesus Cristo para serem modelos e exemplos a todos os que os vêem atuando na seara do Senhor!
3- “Cheios do Espírito Santo” (Critério Espiritual)
– O terceiro critério para escolha dos diáconos, apontado pelos apóstolos, foi espiritual. Os homens levantados para servir na comunidade da fé deveriam ser “cheios do Espírito Santo”. Na verdade, este é o critério mais importante de todos, pois é o que caracteriza o serviço dos santos na seara do Senhor, porquanto ninguém deve ousar servi-LO sem ter a sua unção. Não conseguiremos executar nosso serviço sem a presença do Espírito de Deus, pois é Ele quem derrama poder sobre nossas vidas para que a obra de Deus seja realizada. Não adianta termos disposição, eficiência, habilidade e boa vontade. Para o ministério cristão a unção é imprescindível. No contexto de Atos 6, aprendemos que os diáconos foram levantados para distribuir cestas básicas para as viúvas e mesmo para um serviço tão óbvio e simples, pois bastava saber quem eram as viúvas necessitadas, cadastrá-las e distribuir os mantimentos, mas apesar da obviedade, os apóstolos entenderam que para o serviço deveria ser alguém com poder do alto para realizá-lo. Deveria ser “cheio do Espírito Santo”. Que poderosa lição! Que poderosa advertência! Deus não quer carnais na sua obra. Deus não quer indolentes, preguiçosos e derrotados. Deus quer homens e mulheres simples, mas cheios do Espírito. Que levantemos nossas mãos para a obra de Deus, somente depois de recebermos sua unção e se tivermos comunhão com o Espírito. É um erro supormos que pelo fato de um ministério na igreja ter uma característica mais administrativa (patrimônio, zeladoria, cantina, ação social e etc.) que não devemos ser cheios do Espírito Santo para exercê-lo. No Reino de Deus, seja qual for o serviço, é fundamental a unção e o controle do Espírito sobre nós.
4 – “E de Sabedoria” (Critério Intelectual)
– O quarto critério para escolha dos diáconos, apontado pelos apóstolos, foi intelectual. Os homens levantados para servir na comunidade da fé deveriam ser cheios de sabedoria, pois teriam que lidar com as demandas dos irmãos que precisariam de socorro e alívio. Como o contexto da passagem indica que o socorro aos aflitos era o “pano de fundo” da escolha daqueles homens, significa, então, que eles teriam que saber distinguir quem eram realmente os carentes dos que apenas tentavam se aproveitar da generosidade e visão social dos primeiros cristãos. Para tanto, seria fundamental o bom senso; a percepção; a distinção entre os tipos de problemas e as devidas soluções. Destarte, para o bom desempenho de suas funções, aqueles diáconos precisavam ser sábios.
Homens de bom senso. Que saberiam usar a mente de Cristo (1 Co 2.16). Toda liderança cristã precisa ser dotada desta capacidade (1 Co 12. 8). Saber quais os caminhos a serem escolhidos diante de uma situação. Saber tomar providências. Encontrar soluções práticas. Ter uma palavra sóbria, de direção, de conforto, de ajuda, de construção, de edificação, de reconciliação, de apoio e de esperança. Perceba que os apóstolos precisaram de homens “cheios de sabedoria” para os auxiliarem na tarefa da condução da igreja.
Semelhantemente, os pastores hoje também precisam estar cercados de gente assim. De gente sábia, que o ajude na sublime tarefa de levar as ovelhas aos pastos verdes e às águas tranquilas.
5 – “... aos quais encarregaremos deste serviço” (Critério Carismático)
– O quinto e último critério para escolha dos diáconos, apontado pelos apóstolos, foi carismático. Os escolhidos para diaconia deveriam estar dispostos e terem os dons necessários para o serviço indicado. Afinal, eles eram cientes das demandas do ministério, logo, se aceitaram a função, deveriam cumpri-la, pois esta era a expectativa dos apóstolos e também da própria comunidade da fé Os sete diáconos que são eleitos sabiam sobre o que lhes aguardavam. Isso é importante de entendermos, pois há muitos que aceitam a indicação para um ministério, mas que, quando chega a hora do serviço, não querem cumprir.
O diácono, como já vimos nas pastorais anteriores, deve ser alguém disposto a visita, ao serviço na liturgia, ao socorro aos necessitados, às reuniões de oração, às reuniões de edificação, às reuniões administrativas, às devocionais que serão promovidas pelo pastor. Quando os apóstolos declararam que os diáconos seriam encarregados naquele serviço, estavam se referindo especificamente a distribuição de alimentos (Atos 6.1-3), portanto, nenhum daqueles homens levantados poderia se negar a fazer, pois viram as necessidades e aceitaram supri-la. Para o exercício de um ministério o dom, a vocação, o talento, a habilidade, a inclinação são fundamentais. Sem o carisma (dom) de Deus não cumpriremos nossa missão. Pense nisso!
Conclusão
Wayne Gruden, teólogo batista norte-americano, afirma que quando estruturamos nossas igrejas descuidando do respaldo bíblico, terminamos por diminuir a força das Escrituras Sagradas entre nós. Portanto, como igreja protestantes que somos, cujo um dos pilares mais importantes é o Sola Scriptura (Somente a Escritura), devemos, na hora de escolhermos nossos oficiais, observar com esmero o que a Palavra de Deus nos ensina acerca do assunto. Um exame detido de Atos 6.3 e 1 Timóteo 3.1-12, 5.17 e Tito 1.5-11 deverão nortear nossa escolhas para que as façamos levando em conta as orientações de Deus sobre aqueles que devem servir em sua seara. Que Assim seja!
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